SERÁ GUAM A NOVA PEARL HARBOR?
Comecemos com um pouco de história:
Um ataque de surpresa das forças armadas japonesas, em 7 de dezembro de 1941, atingiu em cheio a história da geopolítica mundial. O alvo foi a base naval norte-americana de Pearl Harbor, na ilha de Oahu no Hawai, e precipitou a entrada dos Estados Unidos na II Guerra Mundial.
O ataque nipônico foi realizado com o emprego de mini submarinos armados com torpedos que, por sinal, não tiveram efetividade e por aviões de caça e bombardeiros de combate, esses sim, letais. Todos com o espírito “kamikaze”, termo que descrevia os militares do sol nascente dispostos a sacrificar a própria vida pelo Império.
A ofensiva durou cerca de duas horas, resultou na morte de 2.403 norte-americanos e mais de 1.100 feridos. Provocou também a destruição de 12 navios e mais de 160 aviões dos Estados Unidos. Por sorte os porta-aviões não foram atingidos, pois estavam realizando treinamento de rotina em alto mar.
Do lado nipónico, apenas 64 mortos e cerca de 30 aviões destruídos.
No dia seguinte, o presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt proferiu, em sessão do Congresso, um dos pronunciamentos mais marcantes da história da humanidade, a saber:
“Sete de dezembro de 1941, uma data que viverá na infâmia. Os Estados Unidos foram repentina e deliberadamente atacados por forças navais e aéreas do Império do Japão. (…) Como Comandante-chefe do Exército e da Marinha, ordenei que todas as medidas fossem tomadas para garantir a nossa segurança”.
Ato continuo, os Estados Unidos declararam guerra ao Japão em oito de dezembro de 1941. Três dias depois, a Alemanha, de Adolf Hitler, aliada do Japão, declarou guerra aos Estados Unidos. Estava lançada a II Guerra Mundial em escala global.
Seguiu-se a batalha de Midway, onde os porta-aviões, preservados do ataque a Pearl Harbor, conquistaram sua primeira vitória sobre a esquadra japonesa.
Oito meses depois, a 7 de agosto de 1942, deu-se a Batalha de Guadalcanal, nas ilhas Salomão, a nordeste da Austrália. Os norte-americanos pretendiam impedir que os nipônicos usassem aquele arquipélago como base estratégica para o abastecimento das tropas terrestres em combate nas ilhas do arco do Pacífico.
Mesmo depois da rendição da Alemanha nazista, em oito de maio de 1945, a chamada guerra do Pacífico continuou. Com a recusa de rendição do Japão, os Estados Unidos lançaram uma bomba atómica, apelidada de “Little Boy”, sobre Hiroxima, em seis de agosto de 1945. Três dias depois, lançaram outro artefato nuclear, a bomba “Fat Man”, sobre Nagasaki.
Até agora, decorridos mais de setenta anos, esses foram os dois únicos artefatos nucleares lançados em guerra…e acabaram com a guerra, à custa de 130.000 mortes instantâneas e outras tantas, incontáveis nos anos subsequentes, em decorrência de doenças provocadas pela radiação. Esse foi o trágico fim da oposição do Império japonês aos Estados Unidos.
Em sete de dezembro de 2016, uma grande cerimónia cívica foi realizada no Memorial construído sobre a carcaça afundada do USS Arizona, para assinalar os 75 anos do ataque a Pearl Harbor, em memória daqueles que ali perderam a vida e em homenagem aos antigos combatentes da guerra, sobreviventes.
Nessa oportunidade, o Senador John McCain, filho de um antigo almirante que serviu na marinha dos Estados Unidos durante a II Guerra Mundial, lembrou as “muitas famílias americanas que sofreram perdas naquele dia”. “Também a América mudou para sempre, pelos eventos daquele dia infame, o dia que incendiou a vontade do povo americano, emulando sua grandeza, coragem e determinação, levando a América do Norte a travar e vencer uma guerra mundial”, recordou ele que também se tornou herói de guerra.
Chegamos aos dias de hoje com a Coreia do Norte fazendo as vezes do Japão de antanho. Mas, armada desde já com bombas atômicas, dispondo de vetores de lançamento e com disposição – pelo menos na retórica – de explodi-las sobre Guam, para começar.
Enquanto Kim Jong-un e Donald Trump restringirem-se a retórica belicista, qual duas crianças marcando território, podemos respirar. Mas, considerando a personalidade de ambos e sobretudo o fato de que qualquer lançamento da Coreia do Norte em direção a ilha de Guam, necessariamente atravessará o espaço aéreo japonês e levará apenas catorze minutos para percorrer a trajeto entre o lançamento e o alvo, é de se inferir que eventuais medidas de interceptação deverão ser tomadas de afogadilho em nível tático, sem espaço para maiores considerações estratégicas ou, sequer de identificação entre lançamentos inertes de teste – sem carga explosiva – e lançamentos para valer. O que remete a possibilidade de um “Strangelove” de plantão (vide o filme Dr. Fantástico), apertar o botão errado, antes do tempo,
A China, tradicional aliada do regime de Jong-un já avisou que só tomará as dores da Coreia do Norte se a iniciativa de bombardear partir dos Estados Unidos. Mas que ela estará por sua conta e risco se iniciar o ataque.
Espertamente o regime Coreano, que de bobo não tem nada, seguindo o protocolo, informou que pretende apenas lançar quatro foguetes DE TESTE, atravessando o espaço aéreo japonês com proa de Guam, mas tendo como alvo o oceano, ANTES de atingir a ilha…será?
Essa é a grande dúvida: interceptá-los assumindo que são lançamentos bélicos reais e armados, arriscando provocar uma crise ainda maior se não forem? Trazendo para o baile além da Coreia, o Japão, a China e, de quebra, a Rússia que, como bom chacal, espreita a carnagem para comer depois.
Ou, acreditar que são realmente lançamentos de teste que merecem APENAS as tradicionais vociferações de reprovação? E se forem REAIS?
Aí chegamos ao fulcro da questão e Guam terá se transformado na Pearl Harbor do século XXI.
Maquiavel saberia como resolver a questão: basta armar os interceptadores com uma pequena bomba nuclear que explodirá ao atingir o foguete norte coreano e colocar sobre os ombros de Kim Jong-um culpa e a paternidade da mesma.
O problema será se um desses interceptadores não atingir um ou outro foguete da Coreia do Norte. Aí, valha-nos Deus!
Nunca gostei tanto de morar no hemisfério sul e nunca coloquei tanta fé nas calmas intertropicais para minimizar as consequências da radiação aqui abaixo do equador.
São Paulo, 14 de agosto de 2017
TARCIZIO R. BARBOSA