4 de Fevereiro de 2015. Completo hoje 61 anos. Segundo a igreja católica, 61 anos e 9 meses, pois na concepção já há vida. E porque não antes? Afinal como o mundo surgiu do caos, eu surgi de uma ejaculada – ia usar um outro termo mas meu revisor substituiu – do meu pai. Pode parecer grosseiro, mas é fato.
Em tempos de fertilização de embriões com 3 (três) genitores, procedimento aprovado ontem no Reino Unido, a ciência tem nos levado a novos territórios que poderão mudar a história de nossas origens. Mas nunca ao fim das ejaculadas.
Eu, embora contemporâneo, ainda sou das antigas. Antes até da fertilização in vitro, da inseminação artificial, do DNA… e com a vantagem de parecer razoavelmente com meu pai… o que, afinal não faz a menor diferença para essa minha biografia.
Afinal, todos ainda viemos de uma ejaculada… mesmo que depois selecionada microscopicamente, sem ênfase no meio da palavra.
O esperma ou sêmen é constituído por espermatozoides e pelo conjunto de dois líquidos, sendo estes o líquido seminal e líquido prostático. Esse líquido prostático não tinha grande importância, era mero lubrificante, mas hoje, passados 61 anos e uns nove meses, volta à nossa pauta (mas isso é outro assunto).
O sêmen é composto por uma mistura de secreções testiculares, vesículas seminais, próstata e glândula de Cowper (claro que copiei isso do Google). O sabor é acentuado e um pouco salgado (você sabia?!), no entanto tem variações que estão diretamente relacionados com a alimentação de cada individuo (o meu deve ser adocicado!).
Em volume, a ejaculação de um homem sadio varia entre 3,5 e 5 ml. São considerados normais 200 a 600 milhões de espermatozoides por ejaculação. Um único ml de esperma contém de 60 a 120 milhões de espermatozoides.
Assim, na verdade, como vimos nas descrições acima, tecnicamente sou (ou fui) um mero espermatozoide. Aliás, mero é o *&%#lho! Destaquei-me entre uns 500 milhões de concorrentes; isso considerando apenas a ejaculada que me levou ao óvulo da minha mãe. Bela corrida! Cabe, sem querer me enaltecer, citar o fato de que não havia só esses 500 milhões na disputa. Considerando que sou filho único (o que até afeta pouco os percentuais), também venci (será? Mas isso já é uma questão filosófica mais profunda) os bilhões de outros espermatozoides (só considerando os do meu pai!) que foram parar em outros orifícios, em suas (do meu pai!) mãos, nas paredes, vasos sanitários ou entre as páginas de revistas, depois inutilizadas, com suas páginas grudadas.
Depois de vencer essa primeira e grande corrida, estava preparado para todas as pequenas corridas da vida. Todas as outras corridas foram certamente mais fáceis, mas por razões que desconhecemos umas ficam mais guardadas em nossa memória do que outras. A vida é feita de corridas.
Na infância, disputei corridas muitas vezes, no pique, no polícia e ladrão, na carniça, na pelada, de bicicleta, de rolimã,… ganhei e perdi… aprendi.
Continuamos a correr. Como “Forrest Gump”, corremos fisicamente, intelectualmente, espiritualmente em busca de objetivos… e também somos, ocasionalmente, partícipes involuntários de momentos importantes da humanidade, mesmo que não tão reconhecidos.
Certamente, cada um lembra das corridas que participou. Na família, na escola, no trabalho, na busca de companhia, ou até fugindo de doenças… ou ainda ao encontro delas.
Mas, amigos leitores e companheiros de turma, somos partícipes de uma corrida comum. Entramos na EPCAr vencendo uma corrida contra alguns milhares de concorrentes. E aí começamos outras corridas entre nós… e não vou nem computar os cross-country pela cidade, passando pelo pontilhão e chegando até a BR… ou as fugas da PA… ou até de um pai furioso de uma camofa.
Muitos ficaram pelo caminho. Mas ficar pelo caminho significa disputar outras corridas e não significa perdê-las, pois afinal, surfando na filosofia, nem sabemos porque aqui estamos ou para onde vamos. O importante é continuar correndo.
Mas e os que se foram? Chegaram ou continuam correndo? Deixo a resposta às crenças de cada um, de acordo com a pista que escolheram para correr.
E nós? Por onde corremos? Para onde vamos?
Nessa visão corrida, com duplo sentido, podemos nos enxergar como iguais. Conforme a distância, meros espermatozoides sempre. Além do nosso comum rally pela EPCAr, tivemos nossos rallies pessoais, em nossas trajetórias pessoais… muito em comum e, ao mesmo tempo, muito diferentes. Vivências de estudos, de casamentos, de filhos, de profissão, de espiritualidade, de viagens, de doenças ou de dores em geral, de sexo, de tudo!
E nesses 45 anos de muitas corridas tivemos a oportunidade de reencontrarmo-nos e conversar sobre nossas vivências enriquecendo-nos com a troca de conhecimentos. De 5 em 5 anos temos esse encontro maior, no local que marcou um início de uma corrida comum. Anualmente temos realizado outros encontros com significativa participação. E até mensalmente cultivamos alguns encontros onde somos poucos, mas importantes… afinal, “Non multa, sed multum”.
Depois de me perguntar algumas vezes o que nos faz manter essa chama de reencontros encontrei duas respostas: (1) Esse compartilhamento de experiências sobre nossas corridas com um grupo de corredores que conviveu num período importante da nossa formação de eternos corredores e (2) A possibilidade de experimentarmos, através da memória e de vivências comuns, do exercício de rever como se deu parte da construção de nossas trajetórias nessa corrida especial que passou pela EPCAr e continua…
Vamos curtir essa comemoração dos 45 anos…bodas de platina e platina recheada com nossos 4 estrelas. Que venham os 50, 60, 70… Pensem só, 2040, 70 anos da turma de 70. Eu estarei lá! Ou melhor, aquele espermatozoide esperto que venceu aquela corrida inicial, disputando com centenas de milhões de outros espermatozoides, estará lá!
E para que serviu o esperma do meu pai, além de me conduzir para a vida? Talvez tenha servido de inspiração para essa grande masturbação metalinguística para falar de nós e preencher espaço em nossa revista. Enfim, mais uma corrida …