A Preparação do Aluno da EPCAR

Algumas vezes a gente se pega perguntando para que aprendemos certas coisas, ou então é alguém que nos faz essa pergunta. No entanto, essa é uma questão que um aluno da EPCAR jamais se propôs com relação àquele estudo preparatório à admissão à Escola. Aliás, os anos na Escola serviram para uma constante aplicação daqueles conhecimentos.

No caso da matemática, nem é necessário falar, mas só para ilustrar, problemas como “sabendo que a menor distância entre dois pontos é o comprimento do segmento de reta que os une, determine o lugar onde você deve pular o muro para evitar o PA que (só para sua informação) já está quase alcançando-o?”  ou “se 5 alunos passam mal durante um paradão e esse número dobra no sete de setembro, quanto tempo seu comandante levará para descobrir que é golpe?” foram a base da nossa sobrevivência naqueles três anos.

E, para quem o estudo do português sempre pareceu um excesso de preocupação com os detalhes, a importância de se compreender a sutil diferença entre “o resto” e “os demais” ou a existência de contradição ou não em “explica” e o “não justifica” foi só um aquecimento.

Sem contar o efeito de ser atingido em cheio por uma figura de linguagem, sem mais nem menos, e não a entender: “Cuidado ou a macaca te abraça!” ( Que macaca? ) ou “Viu que vai cair, deita!” (Deitar, no pátio da bandeira?).

Uma tarde, após um almoço durante a semana, quando aproveitávamos qualquer minutinho para uma soneca reparadora entre o massacre da manhã e a destruição total da tarde (não sei você, mas  eu não acredito, muito menos minha mulher, que já acordei às 5:30, assisti a 4 aulas antes do almoço, 4 à tarde, levei trouxa em lavanderia, tirei serviço, ou seja, fui triatleta e não saiba), no momento em que o corneteiro veio gentilmente nos convidar a comparecer a mais uma formaturinha naquele dia, meu colega de beliche, o Pedroso, respondeu de imediato ao chamado com uma misteriosa frase

Já ainda!

Não sei se ele não estava totalmente acordado ou naquela fase em que o sujeito tem todo o direito de confundir um armário com a Vera Fischer (e ainda convidá-la “venha, Verinha, deite-se aqui, o beliche é humilde, mas você será feliz como nunca o foi em sua vida, ó… Tenente Batista! Sim, sim, senhor, já estava indo para a formatura”).  Também não fiquei nas imediações para saber o que aconteceu. Situações assim são potencialmente perigosas: sobra para todo mundo.

Mais tarde, porém,  conversei a respeito com o Azevedo.

Um o-xi-mo-ro!” observou nosso colega.
“….”
A figura de linguagem. Um oxímoro, reunião de palavras contraditórias.

Então, nossa discussão passou a ser se aquele “já ainda”, em particular, fazia sentido. Para mim, parecia um disparate, mas, logo a seguir, não, até era bem razoável. E depois era novamente um absurdo.

E isso até hoje, quase cinquenta anos depois, bastando que eu ouça ou leia algo estapafúrdio. Nesta semana, por exemplo, li num jornal “Cientistas americanos fotografam um trovão”, e, pronto, lá veio o “já ainda”.

Eu até já imagino você, ao ler isto agora, pensando “que bobagem isso de palavras contraditórias reunidas”.  Mas aposto que nos minutos finais ou, como diziam os narradores de futebol, nas últimas voltas do ponteiro do relógio, no último dia do licenciamento, antevendo aquele jejum de uma semana pela frente, ali, no Olympic, não sendo você um dos galãs do SARPA ou um daqueles famosos casanovas, se você não olhava uma menina e começava a descobrir uma feinha bonitinha ou uma sem graça até que jeitosinha.

É, pensando bem, até valia a pena arriscar um oxímoro e outras figuras de linguagem por volta da meia-noite, ali na rua da Boa Morte”.