A HISTÓRIA DO FUTURO
(Prof. Tarcizio)
Aos setenta e cinco anos – e meio – já vividos, constato que o Brasil se tornou previsível em vários aspectos. É quase como um Bolero de Ravel ao inverso. Ao invés da genial composição musical que vai sempre em crescendo até a apoteose decafônica do final, nosso país vai num morrendo que beira o modorrento acalanto que precede a morte.
Já foi o tempo em que heroicos cidadãos se lançavam à luta – e à morte – em defesa de seus ideais. Isso se vê na história passada dos feitos das muitas guerras e batalhas, ganhas ou perdidas, que nossa história registra. Algumas, é verdade, registradas com deturpações de monta.
Para não recuar para muito longe vejo a dita “história oficial” tratar a revolução de 1964 de forma sectária, sob a ótica dos vencidos na ocasião. E isso ninguém me contou, eu vivenciei a verdade.
O que dizer então da revolução constitucionalista de 32? Essa é cantada como vitória, enquanto derrota foi. Nada contra seus ideais professados, mas contra a forma de torcer a realidade crua…foi sim, uma derrota com todas as letras e o sepultamento de nobres ideais, pelo menos por algum tempo.
Tanto numa – 1932 – quanto noutra – 1964 – gente morreu em ambos os lados. E morreram para não compactuar com o que consideravam avesso às próprias convicções. Isso chama-se integridade de caráter. E cumpre a qualquer alma democrática respeitar a opinião dos outros, ainda que não concorde com ela.
Agora, deixando o passado e olhando à frente, o que vemos é um mascaramento safado de “doutrinas” flexíveis que mais confundem do que esclarecem. E isso parece mirar o indisfarçável propósito de criar, tanto quanto possível, cortinas de fumaça que afastem aqueles que se recusam a aprofundar seus pensamentos e conhecimentos, do real âmago da questão.
Nesta quadra de pensamentos prontos, via internet, marqueteiros e afins, a preguiça mental impera soberana.
O “prêt-a-porter” das frases prontas mascara sentidos ocultos, insondáveis na superfície.
Após a segunda guerra mundial, e até a falência da União Soviética, explicitada pela Glasnost de Gorbachev , culminando com a demolição do muro de Berlim, era fácil a identificação doutrinária: ou se era comunista (esquerdista, por definição) ou capitalista (direitista, é claro). Essa era a dicotomia, e pronto.
E hoje? E no futuro?
Agora, a natural mania das pessoas em complicar aquilo que deveria permanecer simples, leva ao tal enevoamento. Tentando por exemplo, misturar conceitos filosóficos conflitantes em um mesmo “ragu” indigesto.
Veja-se a ideia corrente de amalgamar socialismo com democracia. Não é possível, até por definição e pela “praxis”.
Para não ir muito longe, conceituemos que socialismo é “toda doutrina que prega uma transformação radical do regime social (de um povo ou nação), sobretudo da propriedade…(sociol.) doutrina que preconiza a propriedade coletiva dos meios de produção (terra e capital) e a organização de uma sociedade sem classes” (in Michaellis, Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, 1998, Melhoramentos, pág.1961).
Já democracia, é “o governo do povo, sistema em que cada cidadão participa do governo” (opus cit, pág. 651).
A incongruência está na própria definição de ambas, não se conseguem “transformações radicais” sem intervenção totalitária. E intervenções totalitárias são, também, por definição, incompatíveis com a “participação de todos e cada um, no governo”. Pois, como já pontificava Nelson Rodrigues, “toda unanimidade é burra”. E só se pode produzir “transformação radical” com a imposição de unanimidade à força…ditatorial, é claro.
E essa verdade é absoluta. Vide Coréia do Norte, Cuba e, mais recentemente, Venezuela.
Isso posto, o que nos reserva a história futura?
Segundo Murphy, “as pessoas sempre chegam a melhor solução para um problema. Mas, só depois de esgotarem todas as demais”.
Acredito que estamos chegando ao fim de todas as soluções tentadas, com o absurdo de mais de trinta partidos políticos, não sei quantos Ministérios (já perdi a conta) e mais de 4.000 funcionários lotados no Palácio do Planalto, contra 450 na Casa Branca. Deve ser porque o governo americano é menos complexo que o brasileiro. Deve ser, pois lá ainda não se chegou à esbórnia do Estado provedor ou do trabalho criado, inútil, por suposto.
Em se chegando ao fim dessa quadra perversa, a história futura nos deverá levar de volta à simplicidade do racional: partidos políticos com conteúdo e programa, racionalização da máquina administrativa e convicção de que política é dação e não carreira.
Na nossa futura democracia (se lá chegarmos), não haverá espaço para o atual modo Orwelliano onde “todos são iguais perante a lei (in CF, art 5º, caput), mas alguns são mais iguais que outros (in Revolução dos Bichos, texto) ”.
Aliás, que democracia é esta que temos, onde “vicejam” proclamados “reis” do futebol – “imperadores” também (i.e. Adriano) – do “ônibus”, da “canção” etc. “Barões” do tráfico, da soja e outros tantos títulos nobiliárquicos que pertencem a realeza e não à democracia do povo, tal como se define?
Da mesma maneira, pressupondo que numa democracia que se preze todos são, sim, iguais, o que dizer de tratamentos diferenciados como Excelências, Senhorias, Professores-Doutores e outros penduricalhos como “Magnífico Reitor” etc.?
Um respeitoso senhor e senhora já bastaria para todos e qualquer um, pois não?
E foros privilegiados?…sem comentários adicionais.
Também as castas políticas, onde o poder se passa de pai para filho – ou filha – e para apaniguados seguidores, ou as castas da esfera jurídica onde ministros se empenham em emplacar a prole em cargos de juízes (as), procuradores (as) e que tais, não se coadunam com os ideais democráticos. Mas, cabem qual luvas em…monarquias. E, na história do futuro, isso será história do passado…mercê de Deus.
Para a história do futuro tornar-se história do passado e, aí sim, tornar-se História com “H” maiúsculo, precisamos de povo educado e de nação pensante…além do “whatsapp” e da “Wikipédia”…e, segundo nos ensina a história do Império Britânico do século XIX, onde o “sol jamais se punha”, tal a sua extensão ao redor do globo, isso leva no mínimo…cinco gerações. E é para lá que a nossa história mira, se começarmos a trilhar essa senda agora!
E já é tarde para começarmos!
São Paulo, 21 de agosto de 2017
TARCIZIO R. BARBOSA